#36 – A mídia e a mulher

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Eis que, de repente, as mídias sociais estão povoadas por uma expressão que a muitos tem impactado com ares de indignação : bela, recatada e do lar.

É preciso explicar que referida expressão foi adotada por uma revista, de ampla circulação nacional, para descrever a rotina de vida da esposa do vice-presidente da república, Marcela Temer. Ocorre que nisso não há notícia, mas mera informação, já que, não tendo violado o direito de ninguém, cabe a Marcela adotar o estilo de vida que melhor entender. O mesmo se pode dizer em relação a qualquer mulher, quer tenha preferido seguir a carreira profissional, quer não; quer tenha escolhido ter filhos, quer não. A todo tempo na vida fazemos escolhas, as quais, com suas consequências, devem ser respeitadas. Elas decorrem do direito de liberdade, também lido sob o viés do livre arbítrio.

Outro é o cenário, contudo, quando percebemos que a limitação, muitas vezes velada, vem sendo praticada em relação às oportunidades, culminando por sabotar o mencionado direto de escolha. Esta preocupação se aplica ao ainda restrito acesso das mulheres aos mais altos escalões, a exemplo dos cargos de poder mapeados no cenário empresarial e político. Nem sempre tal caminho lhes está verdadeiramente franqueado. A mudança necessária diz respeito à própria cultura vigente e, para tanto, a transformação deve alcançar a todos, não apenas as mulheres. Mais que o agravamento das penas em caso de crimes em que a mulher é vítima, precisamos que eles não aconteçam. Mais que a reserva de cotas para candidatas mulheres, precisamos que sejam efetivamente despertadas para a participação política (cujo cenário ainda é preponderantemente masculino), papel a partir do qual poderão promover as mudanças que esperam.

Ironia é perceber que, no mesmo instante em que se multiplica aquele jargão (bela, recatada e do lar), é veiculada a notícia de que, numa cidade situada no interior do nosso estado, uma mulher foi assassinada pelo marido, o qual logo depois deu fim à própria vida.

Muito há, realmente, a ser conquistado.

O que me conforta é perceber que as mulheres estão cada vez mais se preparando e capacitando para um novo tempo que se aproxima. Nele, não serão tolerados atos discriminatórios ou preconceituosos, ainda que teimem em ocorrer. Nele, a mulher será respeitada pelo que escolheu ser. Gostaria de confessar a você que, percebendo o inconformismo manifestado diante de tais situações injustas, chego a pensar que este tempo já começou.

Programa exibido em 22 de abril de 2016.

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