#22 – Fome de paz

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Este é um convite para que façamos aquilo que mais deve ser valorizado nas relações sociais: conversar.

Sim, porque não há como falar em solução do conflito, sem admitirmos a importância do bom diálogo. Tenho para mim que é justamente a falta dele que tem acarretado o significativo incremento do número de demandas judiciais em tramitação no Poder Judiciário. A falta de diálogo em muitos casos também contribui para a demora na solução do conflito, pois, equivocadamente, muitos pensam que, ao ajuizar a demanda, o problema deixa de ser seu para ser de outrem, quem sabe do Advogado, do Juiz ou do próprio Poder Judiciário.

Não. Mesmo depois de ajuizada a demanda, o problema continua a vincular as pessoas que nele estão envolvidas, as quais, por certo, viveriam muito melhor se o resolvessem.

Por outro lado, o que vemos no Poder Judiciário é o aumento progressivo do número de demandas judiciais. Hoje, há mais de 100 milhões de processos em tramitação em todo o país. A considerar uma pesquisa feita em 2013 no âmbito de 42 países, concluiu-se que, num grupo de 100 mil habitantes, o Brasil conta com 330,4 advogados, ocupando a 5º posição. Contudo, quanto ao número de juízes, tal ordem se inverte, pois contamos com apenas 8,3 magistrados, o que rebaixa a nossa posição para o 39º lugar (quando, na média mundial entre os mesmos 42 países, há 14,5 magistrados para o referido público). Já a média de processos julgados por ano, no âmbito de tais países, é de 736, porém no Brasil alcançamos a média de 1.684 julgamentos por juiz, o que nos confere o 3º lugar entre os países com maior produtividade. Tudo isso, todavia, não é suficiente, pois o número de processos julgados tem sido reiteradamente inferior ao de ajuizados.

A propósito, no site do Tribunal de Justiça de Santa Catarina temos um indicador denominado processômetro, segundo o qual, em 2015, foram julgados 930.233 processos, o que parece expressivo (considerando que contamos com apenas 500 juízes aproximadamente), porém o número de novos processos ajuizados conseguiu ser maior (1.041.488)

Um dado curioso é que, segundo estudo realizado na Fundação Getúlio Vargas, quanto maior a escolaridade de uma pessoa, mais ela tende a procurar a Justiça. É bem verdade que é muito positiva a crescente conscientização do cidadão sobre os seus direitos, porém também é verdade que, na mesma proporção, deveria se dar a consolidação da cultura da pacificação dos conflitos. Para isso, como diziam nossos avós, conversar continua sendo o melhor remédio. Conversar antes, para evitar o conflito. E, instaurado o conflito, conversar enquanto ele persiste, justamente para tentar resolvê-lo (isso pode acontecer em qualquer lugar, inclusive no escritório do advogado das partes ou mesmo na sala de audiências no Fórum).

Somente assim, poderemos um dia inverter o resultado daquele processômetro sobre o qual falei, no mínimo fazendo com que saia do vermelho (ou seja, que o número de processos resolvidos supere o de novos ajuizados). O dia que isso ocorrer teremos alcançado o primeiro grande desafio para a consecução da cidadania que tanto almejamos. Como prêmio, viveremos numa sociedade melhor, onde o respeito ao próximo quiçá se confunda com o nosso próprio direito, num ampla percepção de que o outro é um pouco de nós.

Programa exibido em 15 de janeiro de 2016.

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